Na sabatina do Senado Federal e nas declarações à imprensa feitas, o novo ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, respirou um valor jurídico que é básico nas democracias representativas, o da soberania popular, principalmente nessa época em que se confundem competências legais simplesmente para ocupar espaço político e pretender fazer valer a autoridade num lugar que não pertence a ela.
Está claro para ele que o Poder Judiciário só pode interferir excepcionalmente na seara cujo conteúdo e cuja estrutura organiza − e aquele captura − sua legitimidade pelo voto direto e soberano, no silêncio das urnas.
Nessa perspectiva, aparece mais como estranho o parecer que o procurador-geral da Justiça enviou à Assembleia Legislativa de São Paulo, no qual é favorável à cassação do vice-governador, que consegue ser ministro do Governo Federal sem renunciar ao cargo para o qual foi eleito, que lhe dá o título de herdeiro presuntivo do trono.
A Procuradoria Geral da Justiça não encerra, em sua competência legal, a de assessoria, nem a de consultoria do Poder Legislativo ou do Poder Executivo. Também não encerra em seus poderes o de realizar o controle da constitucionalidade de qualquer ato administrativo ou legislativo, muito menos de recomendar a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito ao Poder Legislativo, nem de se manifestar previamente sobre conduta a ser seguida pelos deputados, que, se realmente guardassem a altivez de seus cargos e funções, simplesmente deveriam respeitosamente devolver a excelente contribuição com os agradecimentos dos representantes do povo.
Mas, o parecer foi enviado e ainda serve para abastecer qualquer discurso político favorável a ele. E ninguém se declarou contra a remessa da manifestação constitucionalmente indevida. A aceitação, por si mesma, é um ato de sabujice.
A palavra de Luís Roberto Barroso pode representar o início de um resgate da sacralidade do voto, ou seja, da soberania popular, para que o Poder Judiciário e o Ministério Público se atenham a suas prerrogativas constitucionais, não se esquecendo de que são carreiras do Estado, sujeitas à lei definida pela forma de seu provimento, ou seja, por meio de concurso, que é a lei da discrição, pois a de exibição é a lei da política.
Publicado originalmente no jornal O Diário