O Supremo Tribunal Federal decidiu que tais e quais documentos que integram o arquivo da investigação de um órgão administrativo do Estado não podem ser exibidos ou entregues na sua integralidade para outro órgão do Estado, ressalvando o direito de acesso aos documentos desde que indicados na sua identidade, e desde que o interesse neles esteja incluído na competência do órgão estatal interessado no acesso.
Essa matéria traz sua relevância, atualmente, com o conflito judicial entre o grupo de procuradores da Lava Jato e a sua chefia maior, ou seja, o Procurador Geral da República (PGR).
A questão pode ser resumida assim: o promotor ou o procurador é intocável na sua atuação. Mas ele tem o poder ou o direito de ocultar documentos de sua investigação, como se fosse propriedade sua?
O grupo de procuradores da Lava Jato em Curitiba infla sua arrogância, que a impunidade tardia não ceifou, com grave perversão da ordem jurídica.
Por quê? Pergunta o cidadão.
Esses procuradores apresentaram, antes e seguidamente, como lição desarquivada, o mantra conhecido de qualquer analfabeto – ninguém está acima da lei. Eles mesmos devem agora estar se imaginando acima dela.
Eis o raciocínio que segue: a Lei Orgânica do Ministério Público é de natureza hierárquica, celebrando a independência funcional do procurador ou promotor em qualquer investigação. Mas o pressuposto dessa garantia é que a autoridade atue dentro da lei.
Trata-se, no caso, do acirrado ânimo de querer colocar o manto do sigilo para impedir acesso à autoridade máxima da instituição à qual esses procuradores pertencem.
Ora, não se admite um verdadeiro “gueto” na escala hierárquica de uma mesma instituição.
O conflito inimaginável nesse momento de trepidação da ordem jurídica, para a qual contribuiu firmemente a arrogância desses procuradores e do ex-juiz que até os comandou, está no Supremo Tribunal Federal, com a liminar concedida pelo presidente autorizando o acesso. A independência para investigar não se desdobra em autonomia para esconder ou arquivar o resultado da investigação, como patrimônio particular, especialmente para o órgão superior de sua instituição.
O Ministério Público Federal, com a atuação abusiva da “república de Curitiba”, tornou-se motivo de controvérsia pública. Os abusos da Lava Jato alcançaram o conhecimento nacional e internacional, veiculados pelo site The Intercepte pela Agência Pública. Tais relatos são tão minuciosos que foram confirmados por procuradores no início desse rosário de abusos. Houve até o precedente da procuradora, que de sua parte pediu desculpas. No entanto, tão logo sentiram que a matéria explosiva seria esticada, no espaço e no tempo, os envolvidos começaram a declarar que a prova era ilícita, como se a imprensa não tivesse a liberdade, como tem, de não revelar sua fonte, e não fosse imprensa livre, como deve ser. Aliás, os vazamentos ilícitos e impunes daquela “república curitibana” fizeram a história negativa da justiça brasileira. E a revelação da parceria com agência de investigação ou de espionagem norte-americana, à revelia do governo brasileiro, desvela o absurdo de se ter um “gueto”, na estrutura do Estado brasileiro, sustentado pela falácia de que o embate contra corrupção, tarefa diária de cada cidadão, dos poderes e das instituições, salvaria um dia o Brasil.
Vale recordar que essa tal “corrupção”, na história constitucional e política do Brasil, é a convidada de honra quando querem golpear as nossas instituições democráticas.
Essa divulgação – massiva – desabona a instituição à qual eles pertencem, colocando no pelourinho do descrédito inclusive a lisura do Poder Judiciário, com o comprometimento de sua legitimidade.
Um brasileiro independente, mas vassalo de interesse estrangeiro, em qualquer área de atuação, revela o país contaminado pela desonra.
O assunto é de gravidade máxima e precisa ser desventrado, uma vez que não basta gritar que tantas publicações advieram de fonte ilícita para enterrar a prova descoberta do abuso na catacumba dos sem-vergonhas (“A verdadeira ameaça à Lava Jato”, publicado neste blog, em 16 ago. 2018).
O que assombra os procuradores e o ex-juiz e ex-ministro é a surpresa veiculada em nível mundial, confirmando o que os advogados denunciavam sem serem ouvidos: senhores, agora todos sabem!