Se alguns políticos mantiverem a frequência de esconderem ou tentarem esconder dinheiro na cueca, o anedotário poderá desenvolver o chamado “direito cuecório”, aquele que garante punição imediata, pública e notória da instituição ou do Poder ao qual o “danado” esteja vinculado, como é o último caso do senador Chico Rodrigues, senador do augusto Senado da República Federativa do Brasil.

Uma forma de autodefesa pessoal, como que se precavendo de eventual e futura punição igual ou semelhante, não pode ficar escondida na desculpa de que o Supremo Tribunal Federal está invadindo a competência de um Poder, e daí não se dá ao ato grave, ridículo e patético a imediata providência que merece, com a prioridade de se garantir sempre a dignidade da instituição ou Poder. E o lengalenga atrasa o saneamento básico necessário e rápido para que não se perca, diminua ou se submeta à maior corrosão a legitimidade do Poder, ou seja, a confiança da cidadania.

Nessas horas cruciais é que tem surgido do fundo da cultura discricionária, acumulada pelo escravismo de mais de três séculos, o tal jeitinho brasileiro para salvar sempre o envolvido em desgraça suprema, daquele que julga estar, como está, no patamar superior da sociedade.

Esse jeitinho da cultura do deixa-disso está presente nas instituições, como o espírito do mal no corpo etéreo do diabo.

Recentemente, o antigo coordenador da Lava Jato foi beneficiado por aquele instituto jurídico que tanto ele criticou, prevenindo sua aplicação em benefício das pessoas que perseguiu com toda força de seu abuso impune. O benefício aconteceu pela aplicação da tal prescrição, que prevê tempo determinado de punição do acusado ou investigado. Dir-se-á: se transcorreu o prazo previsto para punir, tudo bem. Acontece, porém, que o órgão disciplinador que, no caso, é o Conselho Nacional do Ministério Púbico, não conferiu ao processo dele e contra ele a preferência que o coordenador da Lava Jato dera para fazer correr na justiça o processo de seus perseguidos, e daí nasce o charme da extinção da pena, que esquece a punição, mas não esquece o fato. O que talvez possa levá-lo ao tribunal pela responsabilidade civil, fora do âmbito do órgão disciplinador, portanto, para cuja autoridade é inconcebível ou concebível supor, ou não supor, o império da solidariedade corporativa, irmã siamês do jeitinho cheio de jeito da desgraça histórica e nacional.

Se o Supremo não deve invadir a competência de outro Poder, em razão da dignidade da representação popular, o que na prática revela que um só julgador pode punir o representante de milhões de pessoas, de outra parte, o Senado Federal, mediante comunicação de qualquer crime, e no caso de natureza ridícula e vexatória, não pode deixar de proceder imediatamente ao processo cabível para afastar rapidamente essa podridão moral de seu seio.

Uma sociedade, em algum momento histórico, que deve se recompor de crise institucional, política, social e econômica, como este da vida brasileira, deve tirar de suas entranhas a força de uma ética salvadora, que faça com que cada um aja para não danificar o direito do outro, e que os servidores do Estado, além de assumirem-na, devem se consagrar ao incentivo da tolerância e concórdia social no seio de um espaço democrático, no qual a pessoa seja, como é na nossa Constituição, o centro radical de nosso convívio projetado.